O Desejo Depois Da Morte - Capítulo 1
Na Sombra do Ódio
As luzes neon cortaram seus olhos de forma abrupta, rasgando a escuridão que envolvia suas pálpebras. A vista embaçada lentamente se adaptou.
Estava numa limusine extravagante. Nos lados do carro, no teto, havia luzes cintilantes que dançavam em tons de verde e vermelho, piscando sem parar. Criavam uma atmosfera frenética.
O teto da limusine era alto o suficiente para ficar de pé. Percebeu que estava sentado no fundo do veículo. Um corredor estava diante dele, com assentos luxuosos nas laterais.
No lado oposto, no meio do veículo, uma mesa carregada com garrafas de whisky, algumas praticamente vazias, e copos de vidro com cubos de gelo dentro.
Uma limusine…? Minha cabeça dói…
A nuca e a têmpora ainda estavam doloridas pela pancada anterior, apesar de não se lembrar quando foi atingido.
Seus olhos avistaram cinco homens robustos que o cercava, sentados nos outros bancos daquele corredor. Todos vestiam ternos e tinham tatuagens até o pescoço.
Tentou mover os punhos e as pernas, mas estava firmemente amarrado.
— Quem são vocês?— indagou, quebrando o silêncio.
Um dos sequestradores, de cabelo raspado e uma cicatriz na bochecha, o encarou, desdém pairando em sua face.
Ele deu uma boa olhada no rapaz, notando suas características: músculos bem desenvolvidos, visíveis por baixo da camiseta térmica preta, um rosto com uma pele morena suave, um nariz reto e traços agradáveis.
Seus cabelos ondulados e num tom castanho escuro caíam desordenados na frente dos olhos de cor alaranjada, onde uma pinta se destacava no canto direito.
Isso só pode ser coisa do Lupus! Merda, eles agiram rápido! Preciso sair daqui, minha tia pode estar em perigo!
— Ei, Lupus está tão assustado que mandou vocês me sequestrar? — Exibiu um sorriso calmo, embora estivesse tenso. — Me soltem, eu já pretendia falar com ele.
— Cale a boca, imbecil! — advertiu um homem de cabelos brancos, erguendo o punho.
Bam!
O soco atingiu seu estômago com força. A dor queimou e latejou por dentro.
— Ei, toma cuidado, já esqueceu de quem nos fez o pedido? — repreendeu o capanga de cabeça raspada.
— Não importa, a ordem era levá-lo vivo até o Monte Dourado. Duvido que umas pancadas a mais façam diferença! — retrucou o velho.
Tem que estar aqui em algum lugar…
Mexeu os braços de maneira sutil, aproveitando que eles estavam amarrados atrás das costas para esconder seus movimentos.
No bolso de trás das calças, puxou lentamente um canivete, movendo os dedos para cortar as cordas que prendiam seus pulsos.
— Esse garoto chamado Hazan é mesmo o campeão do túmulo? — perguntou o grisalho, encarando o jovem com desprezo. — Ouvi histórias daquele lugar por décadas. Tsc, não posso acreditar que um fedelho como ele está no topo daquele inferno.
São cinco homens armados, eles não podem atirar em um espaço tão pequeno facilmente, é muito arriscado. Consigo nocautear esse cara do meu lado e usar o corpo dele como escudo pra ganhar algum tempo.
Passou os olhos pela pistola no coldre de um dos mercenários e pela trava manual que mantinha a porta do veículo fechada.
Só vou ter uma chance. Meu alcance é horrível por causa dessa amarra nos meus pés, mas eu consigo me virar.
De repente, um telefone tocou. O sequestrador grisalho atendeu a ligação, ouvindo atentamente a voz do outro lado. Um sorriso sádico se estampou em seu rosto enquanto escutava.
— Hehe, repete isso! — exclamou, uma perversidade mal contida na voz.
Ele ativou o viva-voz e aproximou o aparelho do ouvido de Hazan. Entre o zumbido opressor e os estalos de um sinal moribundo, a notícia surgiu de repente, sem qualquer preparação ou piedade:
— Eu disse que o serviço foi cumprido. A tia do rapaz está morta.
O tempo pareceu desacelerar. As palavras soaram como um eco, irreais e impossíveis de aceitar. Risadas sádicas surgiram de cada mercenário, zombando do garoto e de sua reação.
Sentiu o mundo ao redor se desfazer em uma névoa distante. O calor da raiva subiu rapidamente, mas por baixo dela havia algo mais sombrio: impotência.
O quê…? Morta…?
— Hahaha, você é um psicopata mesmo! Olha só a cara dele, parece que sua alma foi arrancada!
Uma série de perguntas invadira a sua mente, desesperado por encontrar uma brecha de esperança.
Seria possível que tudo não passasse de uma brincadeira sádica, uma mentira para fazê-lo sofrer?
Qualquer chance de acreditar que sua tia ainda estava viva era válida, mas o vazio o consumiu.
Seu lado racional traçou uma dolorosa linha de pensamento, que o levou a deduzir que a notícia era verdadeira. Se Lupus estava envolvido, não hesitaria em atacar sua única família.
Sua visão ficou embaçada por um momento, não de dor física, mas pela dor insuportável de saber que ela se foi para sempre.
Hazan mergulhou em um silêncio pesado, os olhos arregalados exibindo choque e desespero. Naquele instante, não havia mais espaço para resquícios de negação.
Quando a vida arranca tudo o que lhe resta, as pessoas reagem de maneiras diferentes.
Uns se agarram à frágil chama da esperança com uma determinação feroz.
Outros mergulham no abismo do desespero, impotentes para encontrar um caminho adiante.
E há aqueles que, para escapar das garras da injustiça, não hesitam em tomar o que precisam dos outros.
No meio dessa encruzilhada de reações, um pequeno grupo de pessoas reagem de maneira ainda mais visceral e perigosa: sua ira cresce exponencialmente ao perceberem que já não têm absolutamente nada a perder.
O grisalho se aproximou, e sussurrou com um prazer doentio, a voz serpenteando no ouvido de Hazan. — Por que essa expressão de espanto, garoto? Hehe, em breve, você estará com el-
Slash!
O silêncio pairou no ar, com o fedor metálico de sangue. Dilacerou a artéria com o canivete, e o grisalho tombou com uma das mãos na garganta. Sangue jorrou, manchando o assento e o vidro em segundos. Não houve pausa, nem hesitação.
— Que diabos!? — exclamou um dos homens ao lado, seu punho se erguendo em direção ao jovem.
Entretanto, antes que o golpe pudesse encontrar seu alvo, Hazan o interceptou com uma mão, torcendo o punho do agressor e perfurando seu cotovelo com o canivete.
Retirou a lâmina e a cravou na lateral da garganta, agarrando os cabelos do homem e fazendo com que seu rosto se chocasse contra o vidro da limusine, rachando-o de uma só vez.
Crack!
Seus outros oponentes estavam paralisados, todos se erguendo dos assentos em choque.
Aquele grupo era composto por mercenários e assassinos experientes, e agora, dois deles estavam caídos, vítimas de um mero garoto.
Um arrepio de medo congelou qualquer resposta imediata.
Com calma, Hazan tirou o canivete do corpo inerte no chão, cortando as amarras que prendiam seus pés.
Arremessou o canivete, sua única salvação, para um canto escuro. Levantou do acento, sua figura emanando uma aura de perigo.
Na natureza, as presas conseguem reconhecer quando estão diante de um predador.
Naquele instante, encarando o semblante imponente do campeão do túmulo, seus instintos gritaram: ele não é apenas um garoto. Ele é um monstro.
— Peguem esse pivete! — urrou outro sequestrador, avançando em sua direção com a postura arqueada e as mãos estendidas para frente.
Já estava preparado para a investida. Recuou um passo, mantendo a distância enquanto o mafioso se aproximava.
Mudou sua postura, abaixando um pouco seu próprio corpo e girando o quadril, ficando próximo do agressor, que impactou contra seu corpo, agarrando suas coxas, visando derrubá-lo.
Deslizou seu braço livre por baixo do pescoço do comparsa e apertou o encaixe, formando a guilhotina em um movimento fluido.
Apesar da limusine estar em movimento, a base do jovem era sólida o suficiente para se manter equilibrado. O mesmo não podia ser dito para os mafiosos.
— Que m-merda…!?
O mercenário tentou reagir, tentou erguê-lo do chão, mas era tarde demais. Hazan já havia assegurado o encaixe, e a sentença foi marcada quando começou a aplicar uma pressão monstruosa.
O homem arquejou, seus olhos se arregalaram em desespero enquanto tentava se libertar do aperto.
— M-me… ajuda…!
Os outros homens viram na dor de um companheiro a oportunidade para avançar. Hazan soltou o mafioso da guilhotina e abaixou a cabeça, saindo por pouco da trajetória do soco de um dos capangas.
No meio da esquiva, cerrou os punhos e acertou um golpe em suas costelas. Apoiou a mão no mesmo lugar e o empurrou, fazendo o mercenário colidir contra a mesa repleta de garrafas de bebidas alcoólicas.
O impacto fez as garrafas de whisky se estilhaçarem no chão, criando um estrondo de vidro quebrando.
Confiante em suas habilidades, não esperava perder o equilíbrio quando a limusine virou de repente, pegando-o de surpresa.
O comparsa com a cicatriz no rosto aproveitou o momento para agir.
Agarrou o pescoço de Hazan e o pressionou com violência contra o vidro da limousine.
Puxou a pistola do coldre e encostou o cano gelado na têmpora do rapaz. A situação parecia desesperadora, com suas forças começando a fraquejar enquanto era sufocado.
— Pelo visto você é algo, hein!? Mas não importa, você está morto! Ouviu bem? Morto! — ameaçou o mafioso, sua voz carregada de raiva.
Hazan se manteve em silêncio, pois não havia espaço para se mover.
— Espera aí, seu idiota! E quanto ao trabalho que precisamos fazer!? — perguntou o outro parceiro, com a mão apoiada no estômago.
— Foda-se o trabalho! Esse pirralho matou dois dos nossos!
— E jogar aquela grana preta no lixo!? Seu imbecil, temos duas pessoas a menos para dividir o lucro! — argumentou o parceiro, colocando a mão no ombro do colega em uma tentativa de apaziguar a situação.
Tudo parou. A raiva do mafioso, uma vez fervilhante, parecia agora recuar. A respiração ofegante aos poucos estabilizou, e então, algo inusitado aconteceu.
Seus olhos encontraram os do jovem subjugado, e para sua surpresa, Hazan não desviou o olhar. Pelo contrário, ele lançou um sorriso autoconfiante. Aquela expressão sugeriu que ele detinha as rédeas daquela situação. E o sequestrador não deixaria isso barato.
— Vá para o inferno!
O gatilho da arma foi pressionado.
Bang!
No instante em que ouviu o grito enfurecido, Hazan reagiu em um reflexo sobre-humano. Seu cotovelo subiu, rápido o suficiente para atingir o braço que empunhava a arma.
O impacto lançou o braço do homem para cima, virando o jogo para Hazan. Envolveu seu próprio braço ao redor do mafioso, assumindo a posse da arma. Seus dedos apertaram o gatilho.
Bang! Crack!
O disparo acertou a trava manual da porta, produzindo uma faísca ao ser destruída.
Colocando o seu plano em vigor, agarrou a alavanca, abrindo a porta do veículo. O ar noturno invadiu a limusine, trazendo consigo um aroma de perigo.
Segurou o pulso do mafioso e o lançou para fora do veículo em movimento. O sequestrador gritou e rolou no asfalto, o ar fresco varreu o interior do veículo enquanto o rapaz recuperava o fôlego, observando o homem caído se afastar cada vez mais.
Mal teve tempo para se recuperar quando o último mafioso desferiu uma coronhada na sua cabeça com a arma.
Hazan balançou violentamente, sangue escorrendo pela testa, mas por puro instinto, foi capaz de apoiar a mão na porta da limusine.
Os braços musculosos do mafioso se fecharam ao redor do seu pescoço em um mata-leão implacável. — Quer saber? Foda-se a entrega! Eu disse para o chefe que você era perigoso, e ele foi o primeiro a morrer! Você tem ideia do que vai acontecer, moleque? — rosnou, o tom ameaçador e rancoroso, apertando o estrangulamento com cada vez mais intensidade. — Você vai desmaiar, e quando acordar, estará no meio de uma maldita floresta, amarrado até as tripas! Vou te transformar num saco de pancadas pessoal, e te pendurar de cabeça pra baixo, entendeu!? Tu vai sangrar até morrer!
Um contra o outro, travaram uma batalha desesperada de pura força, os músculos do mafioso tendo clara vantagem sobre a situação. Hazan lutou para se aproximar lentamente de uma garrafa de uísque quebrada no chão.
A sufocante falta de ar que torturava seus pulmões estava levando a consciência à beira de um colapso. Reuniu suas forças, aproveitando-se da adrenalina que fluía pelas suas veias, e empurrou a ponta do tênis contra a borda da garrafa quebrada, lançando-a no ar.
Agarrou a garrafa e a cravou na coxa do agressor, dilacerando a carne.
Scrash!
— Argh! — o grito rasgou o ar com o vidro penetrando sua coxa, e o aperto no seu pescoço cedeu.
No mesmo instante, Hazan virou, lançando uma cotovelada na mandíbula de seu agressor, que o acertou num estalo alto. A confusão tomou conta do rosto do capanga.
E não havia piedade.
Um chute frontal da sola do pé lançou o homem com violência através da porta escancarada da limusine. A borda da porta foi a salvação do homem de terno, que se agarrou a ela no último segundo, com dedos brancos de tensão. — Seu desgraçado! — rugiu, os dentes cerrados, voltando a avançar com o dobro de intensidade e raiva.
Ainda tonto, Hazan mal conseguia se equilibrar quando sofreu o impacto da investida. Sua cabeça colidiu violentamente contra a lateral da limusine, sua cabeça formigando e latejando.
O sequestrador, exibindo um sorriso confiante, agarrou os cabelos de Hazan e empurrou sua cabeça para fora do veículo em movimento. Os olhos do jovem captaram a estrada que passava perigosamente perto de seu rosto.
— Que tal darmos um trato nesse rosto, hmm?! — O sequestrador provocou, empurrando a cabeça do jovem contra o chão fora da limusine.
Com as mãos e os joelhos apoiados no piso da limusine, Hazan lutou para empurrar a cabeça para trás, os músculos tensos de esforço e os dentes cerrados.
Não era o suficiente. A diferença de peso continuava a empurrá-lo para fora do veículo, cada vez mais perto do asfalto brutal.
Em um movimento arriscado, apoiou o corpo com uma mão e usou a outra para agarrar o pulso que empurrava sua cabeça e quebrou o polegar. Um grito de agonia ecoou pelo interior da limusine, e o sequestrador perdeu o controle, focando em seu polegar com uma fratura exposta.
Hazan, agora livre, se levantou, ainda ajoelhado, e com a mão livre empurrou o rosto do homem contra o asfalto que passava rapidamente do lado de fora.
Scrash!
O som da pele sendo rasgada foi atroz, começando pelo nariz e subindo pela testa, enquanto os gritos agonizantes do agressor cortavam o ar. Não sendo capaz de suportar a fricção constante, desmaiou.
Ficou de pé, agarrou o homem pelo colarinho ensanguentado de seu terno, o rosto desfigurado, e o arremessou para fora da limusine em movimento.
O corpo do mafioso desapareceu na estrada como uma sombra na noite.
O suor não parava de escorrer. Finalmente parou, seus olhos fixos no interior caótico da limusine: dois cadáveres jogados no fundo do corredor e um homem inconsciente.
Não saiu exatamente do jeito que eu planejava…
Socou a lateral do veículo, expressando raiva.
Lupus, você vai pagar por isso!
Passo a passo, Hazan se aproximou de um mercenário, sua mão encontrando a empunhadura da pistola no coldre. Por um instante, olhou para a arma, sentindo o peso frio e letal em suas mãos.
Seus inimigos conheciam aquela sensação, e não mereciam piedade alguma. Ele hesitou, os ecos das vozes de seus oponentes ainda reverberando em sua mente.
Como cheguei a esse ponto? Antes de puxar o gatilho, algo dentro dele gritou para parar, mas ele o silenciou com um pensamento: Lupus cruzou uma linha que nunca deveria ter cruzado.
Bang! Bang!
Após finalizar o mercenário, retornou ao final do corredor. Diante dele, um painel de aço quadriculado bloqueava o caminho. Bateu na superfície com a arma, exigindo uma abertura.
Após um instante de tensão, o painel cedeu, criando uma fenda. Posicionou o cano da pistola na abertura recém-formada.
No entanto, o que estava do outro lado não era o mafioso ameaçador que imaginava. Em vez disso, um homem idoso o encarou, com maçãs no rosto e rugas de uma vida bem vivida marcando sua expressão.
Por um instante, suas ações vacilaram. Olhou para os olhos assustados do idoso e enxergou o reflexo assustador de si mesmo. Não se reconheceu.
— Você vai parar e sair deste veículo — mandou, a voz tensa, grossa e direta.
O motorista assentiu e diminuiu a velocidade do veículo, parando de vez. Ele saiu da limusine, deparando-se com o jovem ensanguentado. Seus olhos se encontraram, e o idoso abaixou o olhar.
Hazan olhou envolta, notando a rua vazia. Fachadas antigas, lojas comerciais e pequenos prédios sequer possuíam luzes, deixando a rua com um aspecto abandonado.
Ao longe, seus olhos inquietos alcançaram o Monte Dourado, uma estrutura semelhante a um castelo medieval, com suas torres revestidas em um dourado brilhante. A floresta densa ao redor daquele ponto turístico parecia engolir o horizonte.
— Ei, velho, me dê o seu telefone — exigiu.
O motorista acenou e entregou para o rapaz, que digitou alguns números. Segundos depois, um policial atendeu.
— Se querem saber a origem da pasta de documentos relacionada as lutas clandestinas do túmulo, venham até o Monte Dourado. E sejam rápidos, não estou com tanta paciência — finalizou, desligando antes que o policial pudesse responder.
Essa parte da cidade não tá vazia por acaso, e a floresta com certeza está cheia de homens… Que se foda.
Encarou a arma em sua mão e seu lábio se curvou em desprezo.
Não preciso disso.
Jogou a arma fora e devolveu o telefone para o velho homem.
— Dê o fora daqui, e não comente com ninguém sobre o que aconteceu se não quiser ser envolvido nisso, você entendeu?
O senhor concordou. — M-meu jovem… Tome cuidado. Essa gente não se importa com a vida alheia…
Essas foram suas últimas palavras para aquele jovem perturbado, antes dele entrar na floresta obscura.
❧ ⚜ ❧ ⚜ ❧
Homens armados e trajando ternos pretos corriam pela floresta escura, os galhos das árvores se emaranhavam em seus cabelos e roupas ao avançarem rapidamente.
Suas pistolas estavam apontadas para frente, prontas para atirar no primeiro alvo que encontrassem.
Um deles parou e levantou a mão, sinalizando para que os outros parassem também. Eles se agruparam, falando em voz baixa.
— O que foi? — sussurrou um deles.
— Eu ouvi algo nos arbustos… — respondeu o outro, seus olhos cheios de receio.
Se aproximaram do matagal, tensos e prontos para atirar, mas não viram nada.
Crack!
Então, o som de algo se quebrando reverberou e, ao olharem para o lado, viram um vulto preto se misturando na escuridão e seu aliado sendo arrastado junto.
Os dois homens restantes se viraram rapidamente, apontando suas armas para o vulto, que já havia se tornado parte das sombras com naturalidade.
— Merda, merda, merda! Apareça, seu filho da puta covarde! — gritou desesperadamente um dos homens.
Desafiando as expectativas, Hazan apareceu em meio aos arbustos. O lado esquerdo de seu rosto estava manchado de sangue.
Seus olhos alaranjados tinham um brilho ameaçador, contrastando com a frieza de suas feições.
Segurava o recém-cadáver pela gola do terno com apenas uma mão, o pescoço torcido em um ângulo estranho.
Ao se depararem com quem estava em sua frente, se esqueceram por um momento o motivo de sua perseguição.
Num estalo, recuperaram o foco. — Te achamos, seu merdinha! — berrou um deles, e ambos apontaram suas armas para Hazan.
Bang! Bang! Bang!
Esvaziaram todo o pente, seus rostos foram iluminados pelos disparos consecutivos, e as armas esquentaram ao ponto de produzirem uma quantidade considerável de fumaça.
— Aposto que ele está cheio de buracos! Hehe, vamos ganhar uma grana por pegar esse desgraçado. Campeão do túmulo? Que piada!
A fumaça dispersou-se, desmoronando a face confiante dos mafiosos. Hazan tinha erguido o cadáver do homem morto para se defender dos tiros, deixando a casca vazia no chão. Furos esguichavam sangue por conta das artérias rompidas. O terno, em frangalhos, revelava por debaixo um colete a prova de balas
Largou o cadáver no chão, encarando as expressões patéticas daqueles assassinos em silêncio.
— I-impossível! — balbuciou o mafioso, suas pernas tremendo diante daquele olhar penetrante. — S-seu demônio! Morra de uma vez! — vociferou, tirando uma faca de dentro de seu terno e avançando contra o rapaz.
Desviou do primeiro ataque com um passo para o lado, e em resposta, segurou o punho da faca.
Girou o braço do mafioso, o que fez ele perder o controle da faca. A lâmina caiu num barulho abafado de folhas secas, e o lutador mantinha sua pegada firme no pulso de seu oponente.
Hazan cerrou os punhos e desferiu um golpe, acertando bem no meio do nariz com a força de um martelo. O som do osso quebrando produziu um barulho alto.
Crack!
Isso estava longe de ser o suficiente.
Continuou afundando o seu punho no rosto daquele homem, várias e várias vezes, a face distorcida já não podia mais ser chamada de humana, e o sangue em seu punho se tornou mais espesso e escabroso à medida que socava.
O homem, tomado pelo medo, observou seu companheiro ser destruído na frente de seus olhos.
Esse cara é completamente maluco! Porra, preciso recarregar minha arma!
Olhou ao redor com medo enquanto o coração batia forte em seu peito. Podia sentir os olhos de Hazan sobre ele. Antes que pudesse fazer algo, sentiu seu estômago latejar e afundar num impacto violento, causado por um chute brutal do lutador
Desabou no solo, o temor estampado em seu rosto pálido.
Apoiou as mãos trêmulas no chão, cuspindo sangue, buscando se arrastar pelo chão.
Onde ele foi!? Tenho certeza de que estava bem aqui agora pouco! Merda, merda, merda!
Seu olhar percorreu o bosque repleto de árvores que pareciam sorrir de forma demoníaca.
Em seguida, olhou para o outro lado e arregalou os olhos. Os corpos inertes de seus companheiros estavam estirados no chão, fantasmas que premeditavam a tragédia que o aguardava.
Porra…!
Um arrepio percorreu seu corpo quando, por um momento, uma presença ameaçadora parecia pesar em sua nuca.
Lançou um olhar cauteloso para trás, mas havia apenas um tronco de árvore solitário.
Com a respiração ofegante, se recostou contra o tronco e deslizou a faca para fora do terno, apertando firmemente o cabo com ambas as mãos.
E então, diante dele, surgiu Hazan, seus olhos fixos, perfurando sua postura patética.
Um poderoso chute encontrou seu nariz, fazendo sua cabeça colidir com a árvore em um baque seco, balançando a árvore o suficiente para as folhas caírem.
Bam!
A faca escapou de suas mãos, e Hazan se aproximou devagar. Segurou o homem pelos cabelos, forçando sua cabeça contra o tronco áspero da árvore.
Não satisfeito, uma joelhada atingiu o rosto do mafioso, completando a tarefa de quebrar seu nariz e levando alguns dentes da frente no processo.
Crack!
— Você não é nada além de um verme, um peão patético em um jogo que nem entende — disse Hazan, sua voz perigosamente calma e suave.
Esse garoto é bizarro… Porra, como Lupus conseguiu controlar alguém assim!?
Hazan se abaixou ao lado dele, e agarrou o seu pescoço com uma das mãos. Apertou com força suficiente para fazer com que ele se engasgasse.
— Não devia ter se envolvido nisso — sussurrou Hazan, sua voz fria. — Farei questão de matar um por um.
Suas mãos tentaram desesperadamente soltar o aperto do lutador, e apesar de lutar com todas as suas forças, nada funcionava. Seus olhos arregalados imploravam por misericórdia.
Os dedos afundaram nas artérias do pescoço, deixando o sangue vazar. Ele pôde sentir pulsação irregular das veias, e ouvia os ruídos abafados de agonia escapando da garganta daquele criminoso.
À beira da inconsciência, a fraqueza se apoderou daquele homem. Seus olhos perderam o brilho, o desespero substituído por uma rendição inevitável.
Parou de se mover, seus músculos relaxaram, e seu olhar vago foi fixado em Hazan.
Soltou o corpo sem vida no chão, se levantou e olhou ao redor, observando os cadáveres dos homens que o haviam perseguido. Não sentiu nada.
— Ei! Ouvi disparos por aqui! — gritou uma voz que se aproximava gradualmente.
Isso mesmo, venham todos. Aqui será o cemitério de cada um de vocês.
Com a adrenalina correndo em suas veias, Hazan usou a floresta escura e a noite como seu campo de batalha.
A ausência de armas não era um obstáculo para alguém que praticou artes marciais a vida inteira.
Sua mente se encontrava entorpecida, as noções de tempo e espaço se misturando em um turbilhão confuso.
A morte não era uma opção que considerava, não até que a fonte de seu tormento fosse enfrentada.
Mais uma vez, estava lutando para matar.
As vidas que tirava em sua busca pareciam fantasmas distantes, seus rostos embaçados por uma névoa densa, de tão entorpecido que estava sua mente.
A raiva se tornou a única força orientadora da qual podia se apoiar.
Na sombra do ódio que dominava sua mente, não havia alternativa senão essa. Seu contato com a realidade estava manchado por um sangue que não lhe pertencia.
A cada vida tirada, se questionava em silêncio: Qual é o valor das vidas que lucram através do sofrimento alheio?
À medida que o tempo passava, mais inimigos caíam perante a habilidade de Hazan.
Os sons de ossos quebrando e gemidos agonizantes, misturados a disparos frutos do desespero, ecoavam pela floresta representando gritos de socorro.
Seu objetivo era o topo do Monte Dourado.
Quando finalmente terminou de subir os incontáveis degraus pelo estreito corredor, emergiu de uma das entradas para o topo, a figura de uma besta, banhado pela luz pálida da lua e pelo sangue de desconhecidos em seu rosto.
O monte dourado era conhecido por ter uma visão privilegiada de toda a capital da Tailândia.
Bem na frente de seus olhos, as luzes coloridas da cidade piscavam, competindo para ver quem chamava mais atenção.
Atingido por uma lufada fria de vento, um impulso desconhecido o fez olhar para trás, observando os diversos corpos estirados pelo caminho que trilhou. Uma trilha profana, traçada com o sangue daqueles que cruzaram seu caminho.
— Está atrasado, garoto.
Apreciando a noite estrelada e fumando um charuto de forma despretensiosa, estava diante dele o homem responsável por tirar a coisa mais importante de sua vida.
Lupus estava ali, tranquilo sob a luz das estrelas, como se nada tivesse acontecido.
Cada pedaço de Hazan estava quebrado. Enquanto caminhava na direção de Lupus, seus punhos cerrados tremiam, não só de ódio, mas de algo que não queria admitir: medo.
Não medo de Lupus, mas medo de si mesmo, de até onde estava disposto a ir. Se perguntou, mesmo que por um segundo, se a vingança seria suficiente para preencher o vazio que sua tia deixou. — Finalmente… achei você! — murmurou, com a voz falhando de raiva.