Vilão da Minha Própria Novel - Capítulo 14
Capítulo 14 – Fragmentos do Destino (3)
07:21 da manhã
O quarto estava mergulhado em silêncio, com exceção do som suave do vento passando pela janela entreaberta e o distante canto de pássaros.
Tudo parecia calmo, até que uma voz cortou a tranquilidade.
“Evan?”
….
“Evan!”
A voz suave e persistente perfurou a escuridão onde eu me encontrava, como um farol chamando-me de volta.
A princípio, resisti, agarrando-me à sensação de vazio que me envolvia.
‘Por favor, me deixe aqui… realmente não quero acordar.’
“Evan! Por favor, acorde!”
Mas a insistência da voz tornou-se impossível de ignorar.
Um toque leve no meu ombro trouxe-me ainda mais perto da superfície.
Minha respiração acelerou, curta e irregular, enquanto minha consciência lentamente voltava.
“Huff, huff…”
Abri os olhos devagar, piscando contra a luz pálida que começava a invadir o quarto.
Cada piscada era como um punhal atravessando minhas pálpebras, a dor que sentia, irradiava até o fundo do meu crânio.
‘Meus olhos… por que está doendo tanto?’
― Evan, você está bem?
A voz preocupada atingiu meus ouvidos como um alarme, trazendo-me de volta à realidade com força.
Meu olhar, ainda turvo, conseguiu distinguir o contorno de Leah ao meu lado.
Ela estava ajoelhada no chão, as mãos apoiadas nos meus ombros e os olhos fixos em mim.
O que chamou minha atenção, foi algo que não pude ignorar.
Seus olhos estavam cheios de lágrimas.
Elas não chegaram a cair, mas o brilho nelas era inconfundível.
― Leah…? ― murmurei.
Eu sentia que minha voz estava rouca e fraca.
Sentei-me com dificuldade. Estava sentindo cada músculo protestando contra o movimento.
Minha cabeça latejava, e uma tontura momentânea me fez fechar os olhos por um instante.
― Graças a Deus… ― Leah suspirou, o alívio em sua voz não escondia o tom de preocupação.
― O que aconteceu com você? Eu te encontrei caído no chão. Você sabe o quanto isso me assustou?
Enquanto recobrava os sentidos com a mão sobre os olhos, acabei me lembrando da noite anterior.
‘Então eu acabei desmaiando depois de adquirir a habilidade “Olhos do Abismo”?’
Olhei para Leah e senti o peso na minha consciência crescer. Mas forcei um sorriso fraco, tentando tranquilizá-la.
― Eu estou bem, Leah. Foi só… uma coisa do treino de ontem. Acho que exagerei um pouco.
― Exagerou???
Leah balançou a cabeça, cruzando os braços com firmeza.
― Evan, você já desmaiou ontem! Eu mesma te trouxe para casa para descansar, e agora quer continuar se esforçando como se nada tivesse acontecido?
Não consegui sustentar o olhar dela.
Eu sentia que as mentiras eram necessárias, mas isso não tornava mais fácil lidar com sua preocupação genuína.
― Desculpa. Eu só… passei do meu limite.
― Evan… você tem agido muito estranho desde que entrou na Spectra. As coisas nem começaram direito, e você já está se forçando ao limite.
Eu sentia sua voz tremer levemente enquanto ela falava.
― Olha para você! Você mal consegue se levantar sem parecer que vai cair de novo.
Eu não tinha respostas.
Não podia contar a verdade para ela e, não podia afastar o peso da culpa. Ela estava ali, claramente preocupada, e eu só podia oferecer desculpas vazias.
Leah suspirou profundamente, o brilho em seus olhos agora mais visível.
― Evan, por favor, ouça. Você precisa descansar. Eu sei que você sempre tenta carregar tudo sozinho, mas… você não está sozinho. Não precisa estar.
Sua voz suavizou no final, e, por um momento, as palavras dela tocaram algo dentro de mim. Mas eu sabia que não podia permitir que ela se aproximasse mais do que isso.
― Eu estou bem, só preciso me recompor um pouco.
Leah estreitou os olhos, claramente insatisfeita com a resposta.
― Certo. Mas só se você prometer que vai descansar. Nada de treinos, nada de esforços desnecessários.
Levantei as mãos em rendição, deixando escapar um pequeno suspiro.
― Prometo.
Ela ficou em silêncio por alguns segundos, como se estivesse me analisando. Então, com um balançar de cabeça, levantou-se.
― Vou preparar o café para vocês. E não se atreva a querer ir para aquela academia de heróis por enquanto.
===
Assim que Leah saiu do quarto, suspirei e me levantei devagar, cada movimento meu parecia exigir mais esforço do que o normal.
Minhas pernas estavam pesadas, e o mundo ao meu redor parecia levemente desfocado.
Ao invés de me sentir melhor depois de uma noite de sono, estava me sentindo acabado.
Caminhei até o banheiro, apoiando-me na parede por um instante antes de finalmente alcançar a pia.
Liguei a torneira, deixando a água fria escorrer por minhas mãos antes de jogá-la no rosto.
“Sigh”
O choque gelado ajudou a me trazer de volta ao presente.
Levantei o olhar e encarei meu reflexo no espelho.
Meu rosto estava abatido, as olheiras escuras contrastavam com a palidez da minha pele.
Mas o que realmente me chamou atenção foram os olhos. A esclera ainda tinha vestígios de vermelhidão, como se a habilidade tivesse deixado marcas visíveis do esforço que exigiu de mim.
‘Isso foi mais intenso do que eu imaginava…’
Passei os dedos pelos olhos, lembrando-me da sensação avassaladora que me atingiu enquanto adquiria “Olhos do Abismo”.
Mesmo no momento de dor extrema, havia algo… diferente.
Era como se a habilidade não estivesse apenas sendo adquirida, mas literalmente se fundindo ao meu corpo, tornando-se uma parte física de mim, algo que eu não poderia simplesmente desligar ou ignorar.
Lembrei-me da visão antes de desmaiar.
Mesmo com os olhos fechados, consegui sentir tudo ao meu redor.
Não era só visão, era algo mais profundo, mais instintivo. Noah e Emma estavam em seus quartos, os contornos de suas camas brilhavam como se tivessem sido desenhados com fios de luz etérea. Eu podia ouvir a respiração leve de cada um, sentir a calma que emanava deles, mesmo à distância.
― Isso… foi real? ― murmurei, passando a mão pelo rosto novamente.
Com um gesto simples, abri a interface do sistema.
✧ [Nome: Evan]
✧ [Idade: 17 anos]
✧ [Vitalidade: 7.2]
✧ [Estamina: 3.4]
✧ [Poder Mágico: 6.7]
✧ [Força Física: 3.1]
Habilidades Adquiridas]
◇ Manipulação de Sombras
◇ Olhos do Abismo {NOVO}
[Pontos Disponíveis: 60]
Meus olhos se fixaram na nova entrada que brilhava na tela.
Minha mão pairou sobre a interface por um instante, hesitando antes de clicar na habilidade.
Mas a curiosidade, ou talvez a necessidade de entender, venceu.
Ao tocar na habilidade, um painel detalhado surgiu diante dos meus olhos.
Habilidade: Olhos do Abismo
Descrição: Permite criar ilusões para enganar os alvos, revelar presenças ocultas e manipular a percepção do tempo, tornando o mundo ao redor do usuário mais lento.
◆ Tempo de Uso Recomendado: 10 segundos ◆
➤ Mesmo nesse limite, pode causar exaustão e dores de cabeça.
➤ Exceder o tempo aumenta drasticamente os riscos, como desorientação e danos temporários à visão.
[Benefícios no Nível 1:]
✦ Ilusões poderosas que afetam a mente dos oponentes.
✦ Percepção ampliada para detectar presenças e reagir rapidamente em combate.
✦ Estratégias e reações aprimoradas devido à manipulação temporal.
[Riscos:]
✦ Alto custo de energia mágica e esforço mental.
✦ Acelera os efeitos da maldição em Evan.
✦ Prolongar o uso pode causar desorientação e visões distorcidas.
Li cada linha atentamente, e minha mente imediatamente voltou à noite anterior.
O limite de 10 segundos a primeiro momento não parecia generoso, mas eu sabia que, se aquele tempo fosse bem usado, a habilidade seria devastadora.
― Isso é… muito mais do que eu esperava.
Meus olhos desceram até o aviso. “Uso prolongado pode levar a severos efeitos colaterais.”
Mesmo no primeiro dia com a habilidade, eu já havia sentido o preço.
Passei a mão pelo rosto, tentando organizar os pensamentos.
‘Na minha novel imaginei isso mais como uma ferramenta, algo que eu poderia usar quando quisesse. Mas parece que isso se fundiu comigo.’
― Se 10 segundos são tudo que posso usar agora, preciso garantir que sejam 10 segundos que façam a diferença.
A tela do sistema desapareceu, mas a sensação de peso permaneceu.
Liguei o chuveiro e deixei a água fria escorrer pelo meu corpo.
Passei os dedos pelos cabelos molhados, respirando fundo.
‘Leah tem razão… pelo menos dessa vez, vou descansar.’
― Acho que não vou para a Spectra por enquanto.
—————————————————————————————————
15:53 da tarde – Domingo
O campo de treinamento fervilhava com a energia de um domingo ensolarado.
Mesmo sem a pressão das aulas após a prova pratica, muitos alunos usavam o tempo para melhorar suas habilidades.
No centro do campo, Arthur e Kai estavam envolvidos em um combate feroz, suas armas colidindo em um ritmo que atraía olhares de admiração.
“Clang!”
A espada de Arthur desviou mais um golpe das manoplas de Kai, gerando faíscas que dançaram no ar.
Nas arquibancadas, Luna estava sentada com as pernas cruzadas, balançando uma garrafa de água nas mãos enquanto observava os dois lutarem.
“Ahhhhh” — Ela suspirou alto, visivelmente entediada.
— Você acha que quem vai levar essa? — ela perguntou a Derek, que estava recostado contra uma parede próxima, observando a luta com desinteresse.
Derek, encostado em uma parede próxima, lançou um olhar cético para Luna, percebendo imediatamente sua intenção.
— Não tenta tirar seu tédio comigo, Luna. — Ele resmungou, cruzando os braços.
Luna abriu um pequeno sorriso provocativo.
— Só estou perguntando. É tão difícil assim me dar uma resposta? Você não é um especialista?
Derek bufou, mas acabou falando.
— Arthur, obviamente. Kai é forte, mas força sem estratégia não significa nada contra alguém como ele.
Luna ergueu uma sobrancelha, intrigada.
— Não dá para subestimar o Kai. Ele é persistente.
— Persistência não vai adiantar se você não consegue acertar um golpe. — Derek rebateu, apontando com o queixo para o campo onde Arthur desviava com precisão de mais um ataque poderoso de Kai.
“Thwack!”
A manopla de Kai encontrou o ar vazio, enquanto Arthur girava habilmente para longe, mantendo-se fora do alcance.
Luna riu levemente, vendo que Derek estava completamente concentrado na luta, apesar de sua aparente relutância em participar da conversa.
Do outro lado, Seraphina permanecia quieta, sentada com os braços cruzados e alheia ao barulho ao redor.
Luna notou sua postura distante e inclinou-se para frente, curiosa.
— E você, Sera? Alguma aposta?
Seraphina piscou, como se estivesse saindo de um transe.
— Hm? Não estou prestando atenção.
— …~O que?…Sério??
— Qual o problema?
— Não… Nada. É que você, normalmente sempre presta atenção nessas coisas.
Derek, sentado mais próximo, percebeu a oportunidade e imediatamente interveio.
— Talvez porque não tenha ninguém interessante lutando, não é, Seraphina?
Ele lançou um olhar confiante na direção dela, como se estivesse tentando desviar o foco para si mesmo.
“haha”
Luna revirou os olhos, soltando uma risada curta e sem humor.
— Ah, claro, Derek, porque você seria tão mais emocionante de assistir, né?
Derek ignorou a provocação, ajustando a postura e fingindo desinteresse, mas seus olhos buscavam qualquer sinal de aprovação em Seraphina.
“Aff” — Vocês dois nunca mudam, não é? — Disse ela com um suspiro de tedio.
“…”
Seraphina balançou a cabeça e estava prestes a dizer algo quando uma voz familiar cortou a conversa.
— Ei, pessoal!
A chegada repentina de Jenna quebrou a rotina. Ela se aproximou com um sorriso radiante, claramente animada.
— Seraphina você viu? Nossa equipe ficou em 4º lugar na prova prática!
Luna abriu um sorriso acolhedor.
— Isso é incrível, Jenna! Foi uma competição difícil.
— Obrigada! Conseguimos 454 pontos. Foi apertado, mas conseguimos nos manter entre os melhores!
— Isso é um feito, essa prova realmente não estava fácil.
Arthur comentou ao se aproximar do grupo, ofegante depois de seu combate.
— A estratégia de vocês deve ter sido boa, conseguir tantos pontos mesmo sem ir de encontro até o artefato principal, pensei que não fosse possível.
Jenna assentiu com entusiasmo.
— E tenho que admitir, parte disso foi graças ao Evan. Ele realmente ajudou nossa equipe a pontuar mais do que esperávamos.
Ao ouvir o nome de Evan, Derek soltou um suspiro teatral, cruzando os braços com um ar de impaciência.
— Ah, sim, o “líder improvável”.
Jenna ergueu uma sobrancelha, claramente irritada.
— O que quer dizer com isso?
Ele deu de ombros, mas o sorriso enviesado denunciava seu tom provocativo.
— Só estou dizendo que é engraçado como alguém que nem parece ligar muito para a Spectra acabou sendo o líder de vocês.
Jenna estreitou os olhos, havia uma frustração evidente em sua postura.
— Talvez porque ele tinha uma estratégia sólida? E porque funcionou?
— Ou talvez vocês tenham tido sorte. Já que se não tivéssemos aparecido naquele momento…
Derek percebendo onde estava chegando, acabou cortando a frase ao meio. Ele não queria dizer algo que fizesse Seraphina pensar que ela dependeu completamente dele, já que ele sabia que ela odiava isso.
Ele estreitou os olhos, mas não continuou imediatamente.
O silêncio que se seguiu parecia pesar no ar, até que ele murmurou, quase inaudível.
— Não sei por que estão tão impressionados com ele.
Seraphina suspirou, mas não se deu ao trabalho de responder.
Kai se aproximou do grupo, ainda ofegante após o treino com Arthur. Ele limpou o suor da testa com o antebraço e lançou um olhar curioso para Jenna.
— Vocês estavam falando do Evan, certo? — perguntou com um sorriso se formando enquanto se apoiava nos joelhos.
Jenna confirmou com um aceno.
— Sim. Ele liderou nossa equipe na prova prática.
Kai ergueu uma sobrancelha, visivelmente interessado.
— Hm, interessante. Como ele se saiu na sua equipe Seraphina?
Seraphina ergueu os olhos, apenas para dar de ombros, como se não quisesse dar muita importância ao assunto.
— Foi… decente. Ele não é ruim.
Kai riu, o tom leve, mas seus olhos brilhavam com entusiasmo.
— Decente? Isso significa que ele foi bom? Adoraria lutar contra ele. Aposto que seria interessante ver o que ele pode fazer.
Arthur, que até então estava calado, deu um longo gole em sua garrafa d’água antes de abaixá-la, limpando o canto da boca com a mão.
— Agora que você mencionou… onde será que ele está? Não o vi na Spectra desde a prova.
O silêncio pairou por um instante, enquanto o grupo trocava olhares.
Derek, que parecia cada vez mais incomodado com a conversa, soltou um suspiro audível, levantando-se.
— Nem adianta procurar por ele. Esse cara não mora no campus, diferente da maioria.
Sua voz carregava um tom de desdém, mas ele evitou prolongar o assunto.
Luna piscou, surpresa com a revelação.
— Ele não está ficando aqui?
O grupo o observou sair enquanto Kai olhava para Arthur, levantando as sobrancelhas com uma expressão questionadora.
— Então ele não esta ficando aqui? Estranho.
Arthur abaixou a garrafa e olhou para Seraphina com um leve sorriso, tentando esclarecer suas dúvidas.
— Bom, faz sentido então ele estar descansando em casa, né? Quer dizer, tanto você quanto ele desmaiaram, certo?
Seraphina desviou o olhar, hesitando por um momento. O questionamento era simples, mas carregava implicações que ela não estava pronta para revelar.
— É… ele estava desmaiado quando cheguei.
— Hm… O monstro que vocês enfrentaram devia ser bem forte para os dois acabarem assim.
— Arthur comentou com uma mão no queixo claramente pensando no assunto.
Antes que Seraphina pudesse dizer algo, Jenna, claramente mais interessada nos detalhes, inclinou-se para frente, os olhos brilhando de curiosidade.
— Espera aí, Seraphina. Como foi que ele acabou desmaiando? O que aconteceu antes disso?
Seraphina fechou a expressão, ponderando por um instante. Não podia contar a verdade sobre a entidade ou o que realmente havia ocorrido. Inspirou profundamente antes de responder, optando por uma versão segura.
— Quando cheguei, ele já estava no chão. Não sei exatamente o que aconteceu antes disso. Talvez tenha se esgotado tentando enfrentar o monstro sozinho.
A explicação parecia suficiente para Jenna, mas Arthur franziu a testa, intrigado.
— Sozinho? Bom, ele deve ter se esforçado bastante, Evan não parece alguém fraco. Um monstro capaz de deixar vocês dois naquele estado não deve ter sido fácil.
— Sim. Mas já estávamos cansados quando encontramos o monstro.
Arthur cruzou os braços, ponderando sobre o que foi dito, enquanto Jenna parecia querer perguntar mais, mas hesitou, talvez percebendo que o assunto incomodava Seraphina.
— Faz sentido. — Arthur concluiu, deixando o assunto de lado, ainda que seus olhos demonstrassem uma ponta de preocupação.
Seraphina desviou o olhar, aparentemente relaxada, mas por dentro, sua mente era um turbilhão de pensamentos.
A verdade sobre aquele encontro, sobre a entidade e as palavras perturbadoras, pesava sobre ela como uma sombra constante.
—————————————————————————————————
4 dias depois
A luz da manhã entrava suavemente pela janela da cozinha, aquecendo o ambiente com tons dourados enquanto eu me concentrava em preparar o café da manhã.
O som sutil da frigideira chiando se misturava ao aroma reconfortante de panquecas e café fresco, preenchendo a cozinha com uma sensação de conforto e rotina.
Era quarta-feira, e quatro dias haviam se passado desde que usei os “Olhos do Abismo” pela primeira vez.
Não voltei à Spectra nem na segunda nem na terça, aproveitando o último dia de licença médica para me recuperar completamente.
Apesar de ainda sentir um leve cansaço, estar em casa com Noah e Emma era um alívio bem-vindo.
― Já está quase pronto! ― avisei, concentrado em fazer as panquecas perfeitas.
Noah estava sentado à mesa, dividido entre o livro que lia e o cheiro tentador vindo da frigideira.
Ele fingia estar completamente absorvido pela leitura, uma tentativa de parecer mais maduro, o que arrancava um sorriso meu. Era uma característica típica dele: querer ser visto como o “mais velho” responsável, mesmo que, no fundo, sua curiosidade infantil estivesse claramente presente.
Emma, por outro lado, era pura energia. Movia-se pela cozinha como um pequeno tornado, ora ajudando a colocar pratos na mesa, ora dançando ao som de uma música que só ela parecia ouvir.
Sua risada preenchia o ambiente, e, como sempre, tentava provocar Noah para arrancar alguma reação, o que ela fazia com uma habilidade quase mágica.
Empilhei as panquecas em um prato enquanto olhava para eles.
― Quem está pronto?
Os olhos de Emma brilharam com antecipação.
― Eu quero muito chocolate! ― ela exclamou praticamente saltando de seu lugar.
Noah, por sua vez, tentou manter sua compostura “adulta”.
― Só um café pra mim, por favor.
Sua voz carregava um tom deliberadamente sério, mas a tentativa de parecer mais velho só o deixava ainda mais adorável.
― Claro, o seu café especial está a caminho.
Enchi um copo com leite, colocando-o em sua frente com uma piscadela.
Ele franziu o cenho por um breve momento, como se quisesse me repreender por estragar sua tentativa de maturidade, mas logo sorriu, aceitando o jogo matinal com a mesma leveza de sempre.
Emma, enquanto isso, já estava espalhando chocolate em sua panqueca, falando sobre algum projeto da escola, enquanto Noah alternava entre o livro e pequenas caretas direcionadas à irmã.
Observar essa dinâmica — suas personalidades tão diferentes, mas tão complementares — era como um bálsamo para os últimos dias.
Não importava o peso dos eventos recentes ou o que estava por vir; esses momentos simples eram suficientes para lembrar que havia algo de bom e genuíno em tudo isso.