Vilão da Minha Própria Novel - Capítulo 16
Capítulo 16 – Fragmentos do Destino (5)
O som suave do vento balançava as folhas, criando um contraste entre o mundo externo calmo e a inquietação que dominava a mente de Seraphina.
Cada passo que dava pelos jardins parecia ecoar mais alto do que deveria, como se aquele ambiente quisesse lembrá-la de sua presença ali.
‘Que lugar irritantemente calmo.’
Seu olhar vagava pelas árvores altas e flores alinhadas com perfeição.
Para muitos, era um refúgio de paz. Para ela, era um espaço onde o silêncio amplificava pensamentos indesejados.
“Tsk” ― Que desperdício de beleza, você não concorda comigo pássaro estranho?
Ela murmurou, dirigindo-se ao pássaro que estava em um galho de uma arvore.
No entanto, como se ofendido por suas palavras, ele abriu as asas e voou, ignorando completamente sua presença.
― Hah, já não basta Luna, agora nem pássaros querem me ouvir.
“…”
“….”
Seraphina avançava pelo jardim até que o avistou Arthur, sentado em um banco sob a sombra de uma árvore, completamente alheio ao mundo ao seu redor.
Ele segurava uma espada no colo, os olhos perdidos na paisagem, como se buscasse algo além do visível.
― Então é aqui que você se esconde.
Seraphina disse com uma voz que cortou a tranquilidade.
Arthur ergueu o olhar e sorriu ao vê-la.
― Escondido? Não mesmo. Digamos que escolhi um lugar mais… sereno para pensar. Você deveria tentar, pode ser terapêutico.
Seraphina bufou, cruzando os braços enquanto se aproximava.
― Terapêutico? Isso parece coisa de quem desistiu de lutar.
Arthur riu suavemente, balançando a cabeça.
― Ou talvez seja coisa de quem aprendeu a valorizar o que a calma tem a oferecer.
― Certo, sábio dos jardins. E o que você está aprendendo de tão importante aqui?
Arthur ergueu a espada, estudando-a por um momento antes de responder.
― Muitas coisas, na verdade. Foco, controle mental, o ritmo do próprio corpo. Tudo isso é mais fácil de trabalhar aqui, sem as distrações da academia.
Ele fez uma pausa, como se ponderasse algo, antes de acrescentar.
― Foi isso que pensei ao ver Evan treinando mais cedo. Ele parecia estar aprendendo mais sobre si mesmo nesse silêncio do que muitos conseguem em um dia inteiro de duelo.
Seraphina arqueou as sobrancelhas, surpresa com a menção.
― Evan? Ele estava aqui?
Arthur assentiu, observando-a com curiosidade.
― Sim, estava. Estava tão imerso no treino que quase não me notou.
Seraphina desviou o olhar, sua mente girando em torno da imagem que Arthur acabara de pintar.
A curiosidade que ela tentava ignorar voltou com força total, alimentada pelas palavras do amigo.
― E para onde ele foi?
Ela tentou soar indiferente, mas acabou falhando miseravelmente.
Arthur notou o tom e não perdeu a oportunidade de provocá-la.
― Desde quando você está tão interessada nos hábitos de treino do Evan? Algo que eu deva saber?
― Vai se lascar Arthur.
“Hahaha”
A resposta veio afiada, mas carregada de humor, suficiente para fazer Arthur rir, balançando a cabeça enquanto reconhecia o típico sarcasmo da amiga.
As bochechas de Seraphina coraram levemente, mas ela rapidamente disfarçou.
Arthur ainda sorria enquanto respondia, apoiando a espada no ombro de forma relaxada.
― Sobre Evan, sei. Faz um tempo que o vi. Ele foi pelo caminho que você veio, então, se não o encontrou, provavelmente já saiu.
Seraphina franziu o cenho, mordendo levemente a lateral do lábio enquanto processava a informação.
‘Do tipo que só aparece quando quer algo.’
Arthur arqueou uma sobrancelha, como se conseguisse ler os pensamentos de Seraphina respondeu.
― Talvez ele só não seja muito bom com pessoas, motivo pelo qual faz ser difícil encontrar ele.
Ele disse com um tom casual, mas o brilho em seus olhos deixava claro que ainda estava tentando se divertir com a reação dela.
― Vai realmente ficar me encarando como se eu estivesse curiosa? Não me faça rir, Arthur. Eu tenho coisas muito mais importantes para me preocupar.
Mas as bochechas dela ainda exibiam um leve tom rosado, o que fez Arthur rir novamente enquanto balançava a cabeça.
― Se você diz…
Arthur riu, mas não insistiu. Ele sabia que, apesar do tom casual, havia algo mais profundo na curiosidade dela. Talvez algo que ela não quisesse compartilhar.
Após um breve silêncio, Arthur se levantou.
― Quer aproveitar que já está aqui para treinar? Não vai encontrar muitas outras oportunidades tão… terapêuticas.
Seraphina descruzou os braços e colocou uma das mãos na cintura, arqueando uma sobrancelha com um sorriso desafiador.
― Terapêutico? Inicialmente eu havia vindo para um duelo, mas acho que bater um pouco em você agora vai acabar sendo divertido.
― Sempre tão confiante. Acho que vou gostar de ver até onde vai essa “diversão”.
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18:34 da noite
Após um dia exaustivo na Spectra, o aconchego de casa era um alívio bem-vindo.
Naquele pequeno espaço, eu não era o aluno sobrecarregado de uma academia de heróis, um escritor ou o portador de uma maldição.
Ali, eu era apenas Evan, o irmão mais velho de Noah e Emma.
O som suave de risadas e o barulho ocasional de lápis arranhando o papel me guiou até a sala.
Noah e Emma estavam sentados no tapete, cercados por um caos organizado de papéis, lápis de cor e livros. Eles estavam tão concentrados que, por um momento, era como se o mundo exterior não existisse.
― E aí, pessoal? Como foi o dia de vocês?
Emma foi a primeira a responder, saltando do chão com um papel em mãos, a energia dela praticamente transbordava.
― Evan, olha só o que eu fiz hoje!
Não pode deixar de rir vendo a cena.
Ela agitava o desenho de um lado para o outro, como se fosse a maior conquista do mundo.
Peguei a folha com cuidado.
Era um emaranhado colorido de formas abstratas, mas o entusiasmo dela era tão contagiante que me acabei me sentindo tão feliz quanto ela.
― Uau, Emma! Isso tá incrível! Acho que temos uma futura artista na família.
Ela riu, satisfeita, e se jogou de volta no chão.
Noah, sentado com a postura ereta e o habitual ar de maturidade precoce, ergueu o olhar de seu livro e decidiu se pronunciar.
― Isso não é nada! Tirei dez na prova de matemática hoje. Ah, e ainda ajudei o Leo com a lição dele. Ele é péssimo com frações.
A maneira como ele falou foi engraçada. Era como se ele quisesse destacar que aquilo era algo totalmente natural para ele.
Eu me abaixei para ficar na altura deles, colocando uma mão no ombro de Noah.
― Isso é incrível, Noah. Estou orgulhoso de você. Além de se sair bem, você ainda ajuda os outros.
Ele tentou disfarçar o sorriso, mas eu sabia que ele estava gostando do reconhecimento.
‘Parece que acertei no elogio.’
Emma, incapaz de ficar fora dos holofotes por muito tempo, deitou no sofá, chutando os pés para o ar.
― Evan, o que vamos comer hoje? Tô com fome!
Ri da impaciência dela, levantando-me do chão.
― Que tal… panquecas para o jantar? Rápido, fácil e todo mundo gosta.
Noah levantou uma sobrancelha, surpreso.
― Panquecas no jantar? Tá bom, isso eu quero ver.
Emma deu um salto do sofá quase batendo no teto.
― Com chocolate? Com frutas? Com tudo?! ― ela disparou, os olhos brilhando.
― Vamos ver o que conseguimos fazer juntos. Mas antes, vocês dois lavem as mãos. Quero ajuda na cozinha.
Os dois correram para o banheiro, competindo para ver quem voltava primeiro.
Aproveitei para pegar os ingredientes enquanto o som das risadas deles ecoava pela casa, enchendo o ambiente de uma energia reconfortante.
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Logo, o aroma familiar de panquecas tomou conta da cozinha, enchendo o ambiente de calor e conforto.
Emma e Noah estavam ao meu lado, ansiosos, enquanto eu terminava de colocar as últimas panquecas na pilha dourada sobre o prato.
Emma tentou pegar uma, mas eu levantei a espátula com um sorriso firme.
“Ahn!” ― Fiz um som curto para chamar a atenção deles.
― Calma aí, mocinha. Antes de atacar as panquecas, vocês precisam comer a comida de verdade. Nada de sobremesa sem jantar.
Noah bufou, cruzando os braços, mas sabia que não adiantava reclamar.
― Qual é, Evan? Panquecas podiam contar como comida de verdade, né?
Eu balancei a cabeça, apontando para o prato que tinha preparado antes.
― Jantar primeiro, depois vocês podem comer as panquecas. E sem choramingar.
Emma suspirou, fazendo uma careta exagerada, mas logo cedeu, pegando o garfo com resignação e sentando-se à mesa.
― Tá bom, mas só porque eu quero provar aquela com chocolate…
Ela resmungava, enquanto enrolava o macarrão no garfo.
Noah, mais prático, já começava a comer e não perdeu a chance de provocá-la.
― Você é tão fácil de convencer, Emma.
‘Mas você está fazendo a mesma coisa que ela Noah.’
Sentei-me com eles, aproveitando o momento para relaxar.
O barulho de garfos contra os pratos e as pequenas discussões sobre quem ia comer mais panquecas enchiam a cozinha de leveza.
Assim que terminaram, Emma praticamente saltou da cadeira.
― Acabei! Agora eu posso montar minha torre de panquecas! ― gritou, correndo para a bancada, com Noah logo atrás dela.
― Não tão rápido! Lavem as mãos antes de mexer na comida, ― chamei, levantando a colher para reforçar minha ordem.
Eles correram para o banheiro, rindo e se empurrando pelo caminho, enquanto eu aproveitava o momento de calma para organizar os pratos e preparar os recheios.
― Francamente. Esses dois….
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Spectra – Refeitório
O refeitório estava mais barulhento do que eu gostaria, com alunos rindo e discutindo planos para o próximo treinamento.
Peguei meu prato e escolhi um lugar no canto mais isolado possível perto de uma janela.
Queria apenas comer em paz e, com sorte, sair antes que alguém decidisse me incomodar.
O meu prato era simples – macarrão com molho básico e alguns vegetais – era funcional.
Não era uma refeição memorável, mas fazia o trabalho de manter as energias.
Peguei o garfo e comecei a enrolar o macarrão lentamente enquanto meus pensamentos vagavam.
As palavras do professor de alguns dias atrás ainda ecoavam na minha mente, me irritando mais do que eu queria admitir.
“Você realmente acha que pode dividir seu foco entre a Spectra e seus irmãos?”
‘Esses desgraçados não entendem.’ ― pensei, deixando o garfo cair sobre o prato.
O cheiro de molho de tomate parecia menos apetitoso agora.
Eu sabia que deveria ignorar, mas a insinuação de que Noah e Emma eram um fardo estavam me perseguindo.
Suspirei, balançando a cabeça para afastar os pensamentos.
Precisava focar no agora.
Peguei o copo de água ao meu lado, bebendo em goles curtos enquanto meus olhos vagavam pelo refeitório. A maioria dos alunos estava absorta em suas próprias conversas, rindo e discutindo sobre a próxima competição da Spectra.
Eles viviam em um mundo tão diferente do meu. Para eles, a Spectra era tudo. Para mim, era apenas mais uma parte de algo muito maior.
‘Pelo menos eu consigo comer sem interrupções,’ ― pensei, mas o alívio foi breve.
Uma sombra surgiu no canto da minha visão.
Quando levantei o olhar, lá estava Maya, parada com um prato nas mãos e um sorriso hesitante no rosto.
Meu objetivo era simples: comer rápido e desaparecer antes que alguém decidisse puxar conversa.
Mas, aparentemente, isso era pedir demais.
Seus cabelos loiros caíam em ondas soltas, e ela parecia estar reunindo coragem para falar.
― Evan… oi. ― A voz dela saiu baixa, quase encoberta pelo barulho do refeitório.
― Oi, Maya.
Minha resposta foi breve, mas não rude. Ainda assim, esperava que ela pegasse a dica e seguisse em frente.
Mas claro que não parecia ser o caso.
― Você… está ocupado? Quer dizer, além de, sabe, comendo.
Maya deu uma risadinha nervosa, ajustando o prato nas mãos.
Suspirei internamente vendo a cena, era engraçada, mas boa parte de mim já sabia o que ela poderia querer.
― Não pretende comer em pé certo?
― ~Ahn.. claro, ― disse ela enquanto se sentava.
“…”
Ela hesitou, mordendo o lábio como se ainda estivesse decidindo se devia continuar.
― Eu queria… pedir sua ajuda.
A frase saiu apressada, como se ela precisasse se livrar das palavras antes que a coragem evaporasse.
Franzi a testa, já não gostando da direção que aquilo estava tomando.
Como que alguém que está precisando de ajuda em tudo, pode ajudar alguém em algo?
Eu me perguntava.
― Ajuda com o quê?
― Magia.
― O que??
― Durante a prova prática, eu vi como você controlava suas sombras. Foi incrível. Preciso melhorar meu controle mágico, e acho que você pode me ensinar.
‘Nem pensar.’
Suspirei, balançando a cabeça.
― Maya, eu não sou professor. E, sinceramente, não estou interessado em dar aulas.
Ela ergueu o olhar, os olhos dela estavam brilhando com determinação, mesmo por trás daquela timidez.
― Eu não estou pedindo aulas completas. Só algumas dicas. Por favor. Eu realmente preciso melhorar.
Ela realmente estava bem determinada, mas, minha primeira reação foi dizer “não” de novo.
Eu tinha coisas demais na cabeça para lidar com isso. Mas antes que eu pudesse cortar o assunto, ela continuou.
― Eu posso pagar. Em Zéns. Sei que todos estão aproveitando o tempo para treinar, então posso compensar seu tempo.
Aquilo me pegou desprevenido.
Não esperava que ela tentasse usar dinheiro para me convencer.
‘Parece que finalmente chegou minha hora.’
Cruzei os braços ainda, só que dessa vez, fingindo desinteresse.
Dinheiro era sempre útil, e talvez isso pudesse ser uma vantagem para mim. Já que minha carteira estava sempre vazia.
― Pagar? ― perguntei, arqueando uma sobrancelha.
Ela assentiu rapidamente, parecendo aliviada por eu estar pelo menos considerando.
― Sim. Eu sei que é pedir muito, e que você provavelmente tem outras coisas para fazer… mas se eu puder compensar seu tempo, talvez…
Maya assentiu rapidamente, como se estivesse agarrando a chance de me convencer antes que eu pudesse mudar de ideia.
― Sim. Eu sei que é pedir muito, e que você provavelmente tem outras coisas para fazer… mas, se eu puder compensar seu tempo, talvez…
Suspirei profundamente, apoiando os cotovelos na mesa enquanto fazia uma pausa dramática.
Era o tipo de reação que, para alguém como Maya, poderia parecer hesitação, mas, na verdade, era completamente calculada.
Detalhe: não era algo que me orgulhava, mas meu tempo participando de teatros escolares antes de cair naquele mundo havia me deixado com uma habilidade inesperada.
Seja fingindo emoções, seja manipulando expressões, eu sabia como fazer alguém acreditar no que eu queria. E naquele momento, eu precisava parecer relutante.
Deixei meu olhar vagar para o prato de macarrão, como se estivesse considerando a proposta dela com a seriedade de um mestre filósofo.
Na verdade, por dentro, eu já estava rindo da situação.
‘Vai ganhar dinheiro Evan, sem fazer nada. Droga… controle a expressão.’
Maya aproveitou o silêncio calculado para continuar.
― Eu posso pagar… 1000 zens por semana.
A colher na minha mão parou no ar. Olhei para ela, piscando lentamente, tentando processar o que eu tinha acabado de ouvir.
‘Mil zéns?’
Minha cabeça fez as contas antes mesmo de eu perceber.
Era quase metade do que eu ganhava na Spectra em um mês. Para algumas “dicas”?
Tive que segurar o impulso de cuspir a água que nem tinha bebido.
Maya, provavelmente interpretando meu olhar surpreso como uma relutância genuína, se apressou em se explicar.
― Eu sei que não é muito… mas não consigo pagar mais do que isso. Meus pais são rígidos com a quantidade de dinheiro que posso gastar por mês. Eles limitam minha mesada para garantir que eu “aprenda responsabilidade financeira” ou algo assim.
Ela fez aspas no ar, o tom misturando frustração com resignação.
Eu já sabia disso. A família dela tinha uma reputação de disciplina e controle, mesmo sendo podres de ricos. Só que, naquele momento, a explicação dela passou direto pela minha cabeça.
Eu precisava manter a postura, mas sentia meu queixo querendo despencar até o chão.
Endireitei-me na cadeira, apertando os dedos no garfo e me obrigando a disfarçar.
Claro, meu coração batia mais rápido, e meu cérebro só conseguia repetir “mil zens por semana?” em um eco infinito.
‘Calma, Evan. Controle a expressão. Atue.’
Respirei fundo e inclinei-me para trás, passando a mão pelo queixo como se ainda estivesse em dúvida.
― Cem… mil? Digo, mil zens? ― Perguntei com a voz cuidadosamente neutra, tentando parecer alguém que não estava prestes a cair da cadeira.
Maya assentiu, sem notar nada de estranho.
― Sim, eu sei que pode não parecer muito, mas acho justo pelo tempo que você vai gastar e não vou exigir nada de você que não possa ensinar.
‘Mil zens parece justo? Maya, você está basicamente me pagando para respirar perto de você!’
Depois de pensar um pouco e viajar em meus pensamentos sobre o que fazer com o dinheiro, encarei Maya novamente.
Ela estava sentada à minha frente, apoiando o rosto na mão enquanto o olhar dela permanecia fixo em mim, quase como se temesse a minha resposta.
Seus olhos azuis pareciam ainda maiores, brilhando com uma expectativa silenciosa, enquanto suas bochechas já exibiam um tom rosado, talvez pela timidez ou pela ansiedade do momento.
Ainda tentando segurar a pose, soltei um suspiro longo e exagerei no olhar cansado, como se estivesse prestes a ceder a um favor impossível.
― Tá bom, ― murmurei, balançando a cabeça com a expressão de alguém prestes a ser muito generoso.
Maya sorriu imediatamente, os olhos dela estavam brilhando de gratidão.
― Obrigada, Evan! Você não vai se arrepender. Prometo que vou dar o meu melhor!
Ela começou a planejar os detalhes do treino ali mesmo, falando sobre horários e lugares, mas eu mal conseguia prestar atenção.
A imagem de mil zens continuava flutuando na minha mente como um sonho impossível.
‘Mil zens por semana… Eu deveria estar dando aulas todos os meses!’
Mantendo minha expressão séria enquanto Maya falava, apenas concordei com um aceno aqui e ali. Por dentro, no entanto, estava comemorando silenciosamente.
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Depois de comer e de uma conversa mais longa do que o esperado com Maya, finalmente deixei o refeitório.
O sol da tarde filtrava-se pelas grandes janelas da Spectra, criando sombras compridas no chão.
Ainda saboreando o alívio de ter garantido um bom dinheiro, eu caminhava com as mãos nos bolsos, já pensando em passar o resto do dia longe de confusões.
Foi quando a vi.
Seraphina estava escorada contra a parede do corredor, braços cruzados e olhar afiado, como se estivesse prestes a interrogar alguém. Seus cabelos vermelhos, presos em um rabo de cavalo como sempre, brilhavam sob a luz, e o uniforme da Spectra parecia até mais imponente com aquela expressão séria no rosto.
Por um instante, congelei.
‘Por que ela está com essa cara? Está esperando alguém?’
Meu olhar foi direto para o chão, evitando encará-la.
Dizem que, quando você cruza com um cachorro bravo na rua, o segredo é não fazer contato visual.
Olhar diretamente nos olhos pode ser interpretado como um desafio e, em um piscar de olhos, você está sendo mordido.
Por algum motivo ridículo, aquilo me veio à mente naquele momento.
E, sinceramente, comparando a expressão de Seraphina com a de um cachorro prestes a atacar… bem, talvez a comparação não fosse tão injusta assim.
Então tentando me convencer de que aquilo não tinha nada a ver comigo.
Decidi arriscar.
Mantive o olhar baixo, focado no fim do corredor, e ajustei o passo como se não tivesse percebido a presença dela.
‘Vai funcionar. É só ignorar.’
Ou pelo menos era o que eu queria.
No momento exato em que passei por ela, Seraphina se afastou da parede em um movimento tão rápido que parecia ter treinado para aquilo.
De repente, ela estava parada bem na minha frente, os braços ainda cruzados, me encarando com uma expressão que parecia dizer algo.
“Você está mesmo tentando me ignorar depois de me fazer esperar?”
Nota Autor:
“Tentando desenhar uma porta duvidosa” https://youtu.be/u32JsQQfT3s