O Desejo Depois Da Morte - Capítulo 5
A culpa é minha.
Lupus apreciava a vista do Monte Dourado, as luzes da cidade cintilando como estrelas distantes abaixo. Seus cabelos brancos cuidadosamente penteados para trás, barba preta e camisa social preta justa realçaram sua imagem sinistra. Um relógio de ouro reluzia em seu pulso.
Ele parecia estranhamente maior do que se lembrava, mas Hazan não se importou.
No cume do Monte Dourado, estendia-se um espaço amplo e sereno, onde degraus antigos levavam ao templo principal. Pequenos jardins ornamentavam o caminho, ladeados por estátuas e sinos cujos toques suaves ressoavam ao sabor do vento.
Algumas árvores esparsas balançavam ao ritmo da brisa fria da noite tailandesa, infundindo uma tranquilidade paradoxal no ambiente, contrastando com a tensão sutil que permeava o ar.
— Essa sede de sangue está bem forte, sabia? — Ele se virou, um sorriso desprezante no rosto.
Antes que o mafioso pudesse concluir sua provocação, Hazan avançou, uma fera sedenta por sangue, seu punho buscando o rosto do mafioso.
No entanto, aquele homem era rápido. Segurou o punho de Hazan e soltou uma baforada de fumaça de charuto que embaçou os olhos do rapaz. Então, com um soco brutal, respondeu, atingindo o estômago do jovem.
Bam!
O impacto fez o lutador cerrar os dentes, mas ele não se deixou abater. Em um movimento pesado, rebateu com um golpe no flanco dele, atingindo o fígado.
Bam!
O grisalho arqueou de dor, cambaleando para trás. Foi a oportunidade de Hazan.
Correu até ele, executando um chute alto em direção ao queixo de Lupus, que tentou se proteger erguendo a guarda. No entanto, a trajetória do chute se curvou no meio da trajetória, encontrando o seu rosto em cheio.
[Chute Brasileiro!]
O mafioso cambaleou, sua expressão de superioridade substituída por uma máscara de choque. Seu charuto caiu, inerte, e o sangue começou a escorrer de seu nariz.
— Como esperado de você, continua cheio de energia! — exclamou o grisalho, abrindo os braços numa postura animada.
Dessa vez, foi ele quem atacou, e Hazan manteve sua guarda firme, protegendo as costelas.
Mas Lupus não era um oponente a ser subestimado. Seu punho se projetou, atingindo o braço do rapaz com um estalo doloroso.
Crack!
Hazan vacilou por um instante, permitindo que Lupus se aproveitasse.
Bam!
O punho cerrado do grisalho acertou o rosto de Hazan. Ele perdeu o equilíbrio, apoiando as costas em um tronco de árvore.
Lupus sorriu, revelando um soco-inglês no punho esquerdo. — Hehe, você nem viu eu pegando isso, não é?
Os olhos do jovem faiscaram de ódio.
O que eu tô fazendo!? Recuando por causa da dor!? Isso não existe, isso não pode existir! Ele tá bem na sua frente, Hazan! Mate o desgraçado! Acabe com ele!
— Não me olhe assim — zombou. — Já passei dos 50, preciso tornar as coisas justas, você entende?
A visão ficou turva e a respiração ofegante. O silêncio no topo do monte era rompido apenas pelo som de suas arfadas.
Meu corpo não se move como eu quero…
— Exausto, hein, garoto? Heh, sabia que você estaria. Eu enchi esse monte de homens, todos preparados para acabar com você. Uma bala de raspão aqui, uma coronhada nas costelas ali… e olha só o que sobrou de você. Agora, me diz, como pretende ganhar de mim assim, caindo aos pedaços?
Hazan não tinha cabeça para contar quantos homens enfrentou e derrotou em sua busca por Lupus. Eram apenas números em uma equação de violência que não tinha escolhido. Suas mãos trêmulas se agarraram à árvore atrás dele, tentando recuperar o fôlego perdido.
Lupus andou em passos calmos, sua expressão sádica iluminada pela luz fraca da lua. O jovem afastou-se da árvore, os braços pesados ao erguer a guarda. Eles tremiam na tentativa de se manterem firmes. O braço atingido pelo soco-inglês estava inchado.
— Mexa-se, garoto! — ele rosnou, desferindo um golpe poderoso diretamente no estômago do rapaz.
Não satisfeito, agarrou o pescoço de Hazan, entregando uma joelhada brutal no mesmo ponto dolorido.
Crack!
Hazan caiu de joelhos, cuspindo sangue que se misturou com o suor no chão. Seus músculos estavam em farrapos, a exaustão e os ferimentos eram evidentes. Cortes feitos por tiros que o acertaram de raspão, arranhões e hematomas espalhados pelo seu corpo, o sangue escorrendo das feridas, tudo que justificava a sua falta de força naquele momento crucial.
Lupus não parou. Acertou as costelas de Hazan com o soco-inglês, e continuou o acertando com diversos socos pesados no mesmo lugar.
Crack!
— Acho que quebrei suas costelas! — exclamou, um sorriso convencido, parando de bater.
O mafioso desferiu um chute frontal acertando a boca do estômago de Hazan, arremessando-o pelo solo, sua dignidade abandonada no piso sagrado do Monte Dourado.
Colocando seu esforço a prova, arrastou os braços trêmulos na esperança de se reerguer, mas Lupus não lhe deu trégua. Outro chute em seu rosto o fez rolar pelo chão.
Mesmo no limite, algo em seu olhar continuava a brilhar, uma chama indomável que persistia, teimosa, contra a exaustão e a dor impressa em cada linha de seu rosto.
— Você é insistente, isso tenho que admitir! — O grisalho comentou, irônico, enfiando as mãos nos bolsos e observando o garoto a se levantar.
Tenho que encontrar uma brecha. Não tenho muita força restante…
Estudou Lupus com olhos atentos, mantendo-se calmo apesar do ódio profundo que esteve tendo controle de suas ações.
Seu olhar se deteve em um volume suspeito no canto direito da cintura do mafioso, algo que parecia ser a coronha de uma pistola se projetando para fora.
Mesmo dizendo que queria me cansar, ele está armado. Mas se quisesse me matar, já o teria feito. Ele está brincando comigo, e não está confiante em um combate direto. É por isso que eu tenho uma chance.
Hazan começou a se levantar, atraindo a atenção de Lupus, que o impediu, pressionando seu peitoral usando seu sapato social.
— Por que diabos você recusou o dinheiro naquela época? — O homem questionou, retirando um charuto do bolso e acendendo-o com um isqueiro.
Ele tragou profundamente e soltou uma nuvem de fumaça no ar antes de continuar. — Enviou tantos lutadores para o inferno, se tornou campeão de uma arena cheia de assassinos e pessoas sem escrúpulos, afiou suas artes marciais ao máximo, e no fim, desistiu dessa posição privilegiada. Você poderia ter quitado suas dívidas e proporcionado à sua tia a vida que ela merecia. Em vez disso, optou por recusar uma quantia exorbitante de dinheiro e denunciar nosso esquema. Por quê?
Hazan ainda estava ofegante, preparando seu corpo para superar temporariamente sua fatiga muscular.
Preciso ganhar tempo.
— Fiz o que fiz porque não tinha escolha, mas alguns bastardos realmente mereceram morrer… — Seus olhos estreitaram, encarando ele de baixo. — Não me arrependo de nada.
— Pode até parecer que fez isso por si mesmo… — O sorriso de Lupus aumentou. — Mas foi pela sua tia, não foi? Isso é puro egoísmo, você sabe.
Hazan sorriu, não acreditando no que estava ouvindo. — Há! Vocês brincam com as vidas de pessoas desesperadas, fazem elas arriscarem suas vidas por uns trocados em dólar e acham que eu sou egoísta?
— Hehe, sim, você é, e eu também. É assim que o mundo funciona, e você sabe muito bem porque eu fiz o que fiz. — Seus olhos retraíram e seu sorriso alargou. — Poder, Hazan. Poder é tudo o que importa. Havia pessoas no Túmulo que nunca gostaram de você. Eu fiz o que era necessário para subir na hierarquia!
— Não me compare a você, somos totalmente diferentes!
— Claro, garoto. Por que não nos despedimos agora? — Lupus levou a mão até a cintura, tirando a pistola de lá.
Agora!
O lutador agarrou o tornozelo do grisalho, erguendo-o, e com um controle impressionante, posicionou o pé de Lupus entre suas pernas, mantendo a tensão na perna de seu oponente.
Seus músculos se destacavam sob a tensão da luta, enquanto ele aplicava a chave de calcanhar com os dentes cerrados de tanta força.
Cada músculo de Hazan parecia esculpido com a pressão. Os tendões e articulações de Lupus estavam sob uma pressão extrema, o homem lutava para não sucumbir à dor excruciante.
Lupus trazia na alma a frieza de quem havia crescido entre facções tailandesas. Ele não era apenas ardiloso; seus golpes impactavam onde a dor era maior. Com seu velho corpo treinado, ele arqueou a coluna numa explosão de pura força e experiência, seu punho avançando para destruir a lateral do rosto de Hazan.
O golpe veio como um trovão. Hazan teve um instante — uma pequena janela — para reagir. Virou o rosto, sentindo o peso gelado do soco-inglês que rasgou sua pele em um corte profundo. Uma ardência infernal percorria a bochecha, mas ele se recusava a ceder.
Se mantenha firme, tá quase quebrando!
No entanto, o mafioso não estava disposto a dar trégua. Seu punho golpeou a caixa torácica de Hazan, e o ar escapou pela brutalidade. Mas o lutador se manteve firme.
Lupus fingiu outro soco, mas, em vez disso, desferiu uma cotovelada devastadora, atingindo o maxilar do Hazan.
Bam!
O impacto fez suas forças esvaírem. A visão escureceu gradualmente, e suas mãos relaxaram involuntariamente. Lupus aproveitou a oportunidade para se desvencilhar, buscando se levantar.
Não…! Ele está se afastando! Está fugindo de mim! Como ele ousa!?
Com a escuridão engolindo seus sentidos, agarrou-se numa alternativa desesperada para permanecer consciente. Num ato selvagem e sem hesitação, abriu a boca e cravou os dentes na própria língua, afundando o fluído vermelho preencher sua boca.
A dor trouxe um choque de adrenalina, o sacudindo de volta à realidade, ainda que fosse sua última chance de permanecer desperto.
Eu me recuso!
O mafioso mal tinha conseguido se levantar quando foi atingido por uma súbita e brutal sequência de ataques de Hazan. Socos, joelhadas, chutes e cotoveladas característicos do Muay Thai. Uma torrente de ataques destinados a desestabilizar seu oponente a qualquer custo, mesmo que sua guarda estivesse fechada.
Como esse garoto ainda tem tanta força!?
O mafioso estava atordoado pela ferocidade dos ataques.
Tão rápido quanto começou, a enxurrada de golpes parou. Lupus abriu a guarda, perplexo, em busca do campeão do túmulo.
Onde ele foi? Preciso pegar a arma e recuperar minha vantagem
Mas antes que pudesse se mover, algo agarrou seu pescoço com uma força implacável. Os braços de Hazan envolveram o pescoço de Lupus como uma cobra num estrangulamento brutal, e o grisalho sentiu sua garganta sendo esmagada.
Eufórico, o homem agarrou a blusa de Hazan, abaixou seu centro de gravidade e o lançou por cima do ombro. O jovem impactou com suas costas no chão.
Bam!
O mafioso tentou acertar o estômago do garoto, mas Hazan rolou pelo chão, o soco-inglês atingindo o chão duro.
Bang!
O som do impacto foi seguido por um choque brutal. Lupus caiu de joelhos, o corpo se curvando. Quando ergueu o olhar, lá estava Hazan, com o braço estendido, a arma ainda fumegando. A expressão de Hazan era sombria, decidida; seu peito subia e descia, ofegante.
Caminhou em direção ao homem grisalho, passos lentos, mas inabaláveis, a arma firme e apontada. Lupus deu uma risada trêmula, os lábios formando um sorriso nervoso que tentava disfarçar o medo crescente.
— Hehe… Hazan, parece que você conseguiu virar o jo—
Bang!
Outro disparo, ainda mais devastador, interrompeu suas palavras. O sorriso de Lupus se esvaiu, substituído por um pavor que lhe contorceu o rosto. O olhar de Hazan emanava uma fúria tão densa, tão afiada, que parecia capaz de cortar o ar entre eles.
Havia esperado por este momento. Aquele que destruíra sua vida, levando-o a cometer atrocidades e a abandonar seus princípios morais, agora jazia caído diante dele.
Mas não era o suficiente. Não ainda. Talvez nunca fosse. Algo nele exigia mais; uma resposta que só o som do gatilho poderia lhe dar.
Hazan ergueu a arma, agora mirando a cabeça do homem.
— Vá para o inferno, Lupus.
Bang!
Um terceiro disparo, mas desta vez, o joelho de Hazan foi atingido por um tiro vindo de longe. Hazan gritou, a arma escorregando de seus dedos, enquanto se contorcia, segurando o joelho destroçado.
Do outro lado, Lupus começou a rir, uma risada enlouquecida que ecoava pelas montanhas, misturando-se ao silêncio do Monte Dourado. Ergueu-se com dificuldade, limpando a poeira das roupas, o sorriso de volta, agora cheio de satisfação.
— Hahaha! — bradou, o riso transbordando em cada palavra. — Realmente achou que tinha acabado com todos os meus homens? Sabe por que isso está acontecendo com você, garoto? É porque você não tem ninguém!
A voz de Lupus atravessava Hazan como um veneno lento, cruel. O mundo ao redor parecia vacilar, a realidade distorcida, e Hazan, ali, entre a dor e o ódio, sentia o peso de uma verdade sufocante.
Tenho certeza de que acertei os dois disparos, então como…!?
Lupus retirou o blazer, afrouxou a gravata vermelha e desabotoou a camisa, revelando um colete à prova de balas.
— Sabe, garoto, acho que talvez eu tenha fraturado algumas costelas. Nunca imaginei que você fosse capaz de me desarmar e usar minha arma contra mim, sabia? — Ele se aproximou de Hazan, desferindo um chute em seu estômago. — Você é como uma estrela, brilhando com teimosia.
Hazan rolou pelo chão, virando-se para encarar uma das escadarias. Uma gangue de mafiosos armados surgiu da entrada, um deles carregando um galão de gasolina.
Porra… falhei em manter minhas promessas, não consegui proteger quem amava, e agora… não consigo fazer… nada…! Levante-se, seu idiota…! Levanta, caralho!
Lupus cravou o pé no joelho destroçado de Hazan, arrancando um grito de pura agonia. O mafioso observou com prazer cada segundo da dor que provocava, inclinando-se para o jovem caído.
— Pensei muito sobre como deveria ser seu fim, Hazan — disse ele, a voz suave. — Sabe quanto custou alugar todo o Monte Dourado só para esta ocasião? Este é o seu valor. Eu queria que você tivesse um final… apropriado. Algo à altura da sua obsessão característica.
Lupus gesticulou para um dos capangas, que obedeceu de imediato, puxando um galão de gasolina. O cheiro acre invadiu o ar enquanto o líquido se espalhava sobre Hazan, encharcando suas roupas, seus cabelos, sua pele, cada centímetro. Por mais que lutasse para se mover, a dor o prendia ao chão como uma âncora.
— Sempre vi você como uma estrela — Lupus continuou, o sorriso sádico brincando em seus lábios. — Uma estrela teimosa, obcecada em brilhar mais do que era capaz de suportar. Por isso pensei: “Por que não deixá-lo brilhar uma última vez?”
Ele fez um sinal com a mão e um dos seus homens se aproximou, entregando-lhe um isqueiro de ouro reluzente, gravado com ornamentos delicados de um dragão.
Lupus segurou o isqueiro nas mãos por um breve instante, tratando a situação como um verdadeiro ritual, e então estendeu a mão para um charuto exclusivo, um Cohiba Espléndido, de folhas maduras e aroma forte, que um de seus homens lhe ofereceu. Ele o acendeu com calma.
Com uma tragada lenta, injetou o charuto em seus pulmões, os olhos fechados por um instante, saboreando o sabor, deixando que o fumo escapasse de seus lábios enquanto observava o jovem ensopado de gasolina.
— Foi bom enquanto durou, Hazan — murmurou ele, a voz rouca pela fumaça, e os olhos refletindo uma frieza profunda. — Envie minhas saudações a Rafaela.
Sem hesitar, abriu a mão, deixando o isqueiro cair em direção ao chão encharcado.
Whoosh!
As chamas rapidamente consumiram o corpo de Hazan, seus gritos se tornaram piores, pois sua carne estava sendo consumida pelo fogo.
Lupus observou o garoto se contorcer e gritar sem exibir qualquer expressão. — Isso não foi tão divertido quanto eu esperava. Acabe com o sofrimento dele — disse, virando-se de costas.
Um dos homens assentiu, sacando a pistola do coldre e apontando-a para Hazan.
Slash!
Um som cortante reverberou pelo local, o segurança caindo de joelhos com a sua mão decepada. O ar ficou mais pesado, tremendo como uma pressão indomável que abateu sobre todos ali presentes, prendendo-os em uma teia de medo.
A voz de Hazan, pesada e penetrante, perfurou o silêncio que envolvia o monte.
— Lupus… — Hazan começou, sua voz transmitindo calmaria antes da tempestade. — Você errou em uma coisa…
A respiração de Lupus congelou e seus músculos endureceram. Ele se virou com dificuldade, encarando Hazan.
— Eu nunca estive sozinho.
Hazan permanecia de pé, uma postura imponente, seu corpo envolto por pequenas chamas que ainda o queimavam. Seus olhos emitiam um brilho laranja, incandescente ao ponto de brilhar naquela noite violenta.
E, por um breve instante, por detrás da aura de Hazan, Lupus não acreditou no que estava vendo. O semblante de Rafaela, quando estava em seu auge, jovem e destemida, em uma postura de combate intimidante, seu olhar o esmagando com tamanha determinação.
Os seguranças lutaram contra aquela paralisia, sacando suas pistolas com um estampido quase ensurdecedor.
Bang! Bang! Bang!
Os disparos dançaram pelo espaço como trovões em uma tempestade iminente, mas Hazan se moveu em uma velocidade sobrenatural. Ele surgiu diante de um dos homens, pegando-o desprevenido.
Grab!
Ergueu seu oponente no ar, suas pernas balançando desesperadamente enquanto a pressão aumentava, esmagando seu crânio até ser destruído num estalo alto.
Os mafiosos, atônitos, finalmente pararam para recarregar suas armas, mas o tempo não estava do lado deles.
O lutador apareceu diante de um grupo de homens desprevenidos, cerrando o punho e socando o primeiro deles. O impacto foi poderoso o suficiente para produzir uma pressão de vento que fez os homens voarem como bonecos de pano pelo ar, caindo monte abaixo.
Bam! Voosh!
— Senhor Lupus, vou tentar ganhar algum tempo! Por favor, corr-
Crack!
Um de seus subordinados gritou em meio àquele caos, até ser atingido por uma estátua budista que o fez capotar, seu corpo totalmente esmagado pelo impacto.
Lupus sequer conseguia correr, suas pernas bambearam ao observar aquele massacre diante dos seus olhos.
Quando a luta acabou, o monte tinha se tornado um cemitério para cada um deles, um mar de corpos espalhados por todo o campo de batalha. E no meio deles eatava Hazan, segurando um capanga pelo pescoço.
— N-não, por favor, e-eu tenho e-esposa e filhos! Eles estão me esperando em c-casa! Eu n-não posso morrer aq-
Crack!
Quebrou o pescoço com facilidade e seus olhos indiferentes recairam sobre Lupus. Jogou o corpo no chão e avançou.
— Hehe… Eu sabia que você era um monstr-
Scrash!
Lupus sentiu o seu peitoral atravessado, e Hazan o ergueu no alto, deixando o sangue jorrar em seu rosto.
Ele alcançou a coluna espinhal do mafioso com a mão que o erguia e a puxou para fora. O corpo foi totalmente estraçalhado, os ossos cortando e deformando o cadáver em um ponto irreversível.
Estava feito.
Largou o corpo no chão e encarou aquele lugar. Não sentia o peso na consciência pelo que havia feito, tampouco algum alívio. Era apenas uma sensação sufocante de estar mergulhado em um mar de sangue.
Caminhou lentamente até a ponta do monte enquanto a força incrível que havia ganhado se esvaia lentamente. As chamas que envolviam seu corpo aos poucos foram dissipando, cedendo espaço a queimaduras cruéis.
Não sei o que foi isso, me senti tão leve, tão forte, e é como se minha tia estivesse aqui… Se eu pudesse ter essa força antes… Não, não importa mais.
Olhou mais uma vez para trás, observando o estrago que tinha feito. Uma estátua de ouro budista estava jogada em um recanto do monte.
Parando pra pensar, não éramos muito religiosos, então nunca visitamos esse lugar. Se buda estiver me observando, foi mal aí pela estátua.
Balançou a cabeça e se sentou na ponte do monte.
Nada mais lhe restava. Rafaela? Estava morta. Seu corpo? Em colapso. Logo se juntaria a ela.
Os olhos, outrora vibrantes em laranja intenso, não apenas perderam seu brilho, mas também exibiam desolação, um vazio profundo e uma completa falta de interesse em continuar vivendo.
Um homem devastado pelo peso cruel de cada perda que o havia despedaçado.
Mesmo assim, as estrelas e o brilho da cidade continuavam a dançar em uma exibição deslumbrante de cores, uma beleza indiferente ao seu sofrimento.
— Rápido! Escutei disparos por aqui! — Uma voz feminina ecoou ao longe.
A polícia? Vocês estão um pouco atrasados… Eu não deixei ninguém vivo, mas espero que eles consigam reunir pistas suficientes para acabar com o túmulo…
Durante toda aquela batalha, uma palpitação incessante estava presente dentro do peito de Hazan. Relembrando a sensação agonizante, mergulhou a mão sob a blusa, retirando dali um colar.
Um cordão adornado por uma pedra de cor alaranjada profundo, abrigando em seu centro uma minúscula folha de carvalho. As bordas arredondadas brilhavam com a prata maciça.
Era o presente de sua mãe, dado com seu habitual sorriso gentil naquele aniversário distante de sete anos. Um presente que veio com o seu falecimento inesperado. O único objeto que o ligava com a alma de quem já tinha partido. Uma promessa de proteção que tinha falhado em honrar.
Com a respiração ofegante, Hazan enfiou a mão no bolso e retirou a mesma foto que olhara horas antes de tudo aquilo acontecer. Ali, congelado no tempo, estava o rosto de sua tia, a única que, em sua memória, ainda parecia viva e próxima. Apertou a fotografia contra o peito, sentindo a fragilidade do papel.
Não pude cumprir minhas promessas com vocês… Fui um fracasso. Pelo menos seus presentes me acompanharão até o fim.
Suas pálpebras pesavam cada vez mais, ameaçando engoli-lo na escuridão. Hazan tombou, seu corpo deslizando para o abismo, onde a gravidade o envolvia numa descida fria e inevitável.
Já não via sentido em resistir, a luta era inútil. Uma sensação estranha para alguém que tinha lutado a vida inteira. Todos os seus músculos relaxaram, um por um.
Esse sentimento esquisito… Não dá pra descrever. Então isso é morrer?
Uma calma letárgica envolveu sua mente, onde anos de sacrifícios, conquistas e sonhos não realizados já não importavam.
Lutou a vida inteira por um objetivo que, no fim, se revelava vazio. Não existia redenção. As falhas acumuladas ao longo de suas escolhas erradas estavam prontas para cobrar o preço final.
Trilhou um caminho de constante luta, sufocado pelo egoísmo dos outros e, eventualmente, forçado a sufocar os outros pelo seu próprio egoísmo. Por quem amava.
O vento assobiava, e o mundo se tornava um quadro embaçado. Hazan era só mais um dos muitos esquecidos. A paz iminente trazia consigo a aceitação amarga de que a roda da existência continuaria a girar, indiferente a ele.
Desistir… É, isso nunca foi muito o meu estilo. Apesar disso, não fui nada além de um filho ingrato… e um sobrinho decepcionante.
Há promessas que, mesmo quebradas, se tornam cicatrizes que carregamos em nossas almas.
Um sorriso amargo se desenhou em seu rosto.
Esse fim miserável, completamente sozinho… é perfeito pra mim.
Hazan sentiu a consciência se esvaindo, o corpo tombando para o inevitável. As estrelas se dissolviam, sendo substituídas pela escuridão total. O último lampejo de luz desapareceu quando foi engolido pelas sombras.
Então veio o baque — seco e brutal. Um som abafado que ecoou pelo vazio da noite, como uma melancia sendo esmagada contra o solo.